quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Lilo odiava o Natal.





Sim,  Lilo odiava profundamente o Natal.
Para ele era apenas uma época horrível em que se gastava muito dinheiro, se comia e bebia demais e as pessoas  só queriam exibir os presentes caros que davam e recebiam.
Então dia 24 de dezembro, ele comprou uma pizza, escolheu filmes, desligou o celular e deitou no sofá bebendo uma cerveja gelada.
A única concessão que ele fazia era acender uma luminária que sua última namorada lhe deu de presente .
Ele detestou o presente de começo, entretanto passou a deixa-la acesa, não como decoração de Natal, mas por que podia deixar as demais luzes da casa apagada.
Para Lilo, isso  desencorajava qualquer vizinho a bater em sua porta na noite de Natal. 

De repente a campainha tocou e ele espantado e praguejando foi abrir a porta.
Quem poderia ser aquela hora.
Todos os seus amigos já haviam desistido de  tentar levá-lo a qualquer celebração natalina.
Ninguém  mais , sequer ousava , dar um simples telefonema no Natal, quanto mais aparecer em sua casa.
Daí o espanto com aquela inesperada presença em sua casa .
Ao abrir a porta, Lilo se deparou com  um garoto de no máximo 14 anos que olhou para ele e logo foi dizendo:

Nossa !
Você está horrível cara!
Ele respondeu em um tom nada amistoso:
E quem é você?
Eu sou você há vinte anos atrás !
Vim para te mostrar umas coisinhas...
Lilo então ao ouvir o que julgou ser um enorme disparate, tratou de bater a porta na cara do maluco.
Sim, só podia ser um maluco, mas o garoto travou a porta com o pé e disse:
Não !
Você vem comigo e vem agora !

Só trata de pegar um casaco.
Enquanto calçava os sapatos, Lilo começou a pensar que era um  trote de algum de seus amigos, mesmo sem imaginar quem teria a infeliz ideia de fazer isso com ele, mas resolveu ir para ver onde isso ia dar.
Claro, que ele já começou a pensar na vingança que realizaria contra este ousado.

Ele saiu sem pegar um casaco, afinal a noite estava quente.
Quem precisaria de casaco?
O garoto o pegou pela mão e sem dizer uma palavra saiu pela porta de incêndio do prédio.
Quando Lilo deu por si, após atravessar a porta, estava na rua, em um lugar que ele não tinha a menor ideia de qual era, mas estava frio,  muito frio e pequenos flocos de neve começavam a cair.
Ele reclamou e o garoto riu e disse: não mandei trazer um casaco!
Lilo olhava para tudo atônito sem entender absolutamente nada do que estava acontecendo.
Andaram um pouco e chegaram a um hospital onde muitas pessoas cantavam lindas canções natalinas para os enfermos.
Todos estavam felizes, apesar dos problemas inerentes ao fato de estarem em um hospital.
Lilo e o garoto escutaram algumas canções.
O garoto chegou mesmo a acompanhar algumas delas.
De repente o garoto puxou Lilo pelo braço e fez sinal que o seguisse e se dirigiram a porta de saída.
Ao passar por ela, Lilo percebeu que estava em outra cidade totalmente diferente e caminharam por algumas ruas iluminadas por luzes de diversas cores, até uma Igreja onde pessoas reverentes assistiam ao Serviço Religioso.
Ficaram lá por tempo suficiente para que Lilo percebesse a paz e alegria que pairava no ar.
As pessoas ouviam o sermão , entoavam alguns cânticos e sorriam.
O garoto fez questão de esperar o fim do Serviço Religioso, cumprimentou algumas pessoas e  Lilo foi obrigado a fazer o mesmo.
Era estranho, mas ele tinha a impressão de já ter estado naquele lugar, um verdadeiro "déjà vu"
Ao sair da Igreja se deu conta que não mais sentia frio, ao contrário estava quente.
Ele então percebeu que estava em outro local.
Era um local muito simples, quase sem iluminação.
Andaram por alguns minutos, o garoto não dizia nem uma palavra.
Aliás, desde que, saíram de seu apartamento o garoto falou pouco e depois do hospital, não disse mais uma palavra sequer.
Ele se recusou a continuar falando, fazendo apenas pequenos gestos com as mãos e com a cabeça.
Eles caminharam até uma rua sem saída, mas cheia de casas,  onde algumas pessoas cantavam e dançavam na rua.
A música era feita por um grupo de homens que tocavam alguns poucos instrumentos, enquanto assavam alguns espetinhos de carne e linguiças em uma churrasqueira improvisada.
Crianças corriam por todo lado.
E todos estavam felizes.
Todos, dava para se notar, estavam se divertindo.
O garoto entrou em uma casa e Lilo o seguiu.
Naquele momento Lilo levou o maior susto, por que quando entraram na casa, ao invés de móveis e paredes, eles chegaram a uma praça.
Neste local muitas pessoas faziam fila para receber uma refeição e um pequeno bolo de Natal.
E ele viu que todos os que estavam ali, inclusive os que estavam trabalhando estavam felizes.
Uns estavam felizes por receber aquela refeição e os outros por poderem proporcionar aquele momento.
Continuaram andando e pararam diante de uma janela de uma linda casa, onde uma velha senhora arrumava tudo para a ceia de Natal e parava para olhar para um porta retrato.
Foi estranho, mas era como se ele estivesse observando de dentro da casa.
Ele podia ver tudo lá dentro e ouvir o que ela dizia.
Lilo estremeceu ao perceber que a foto era dele.
Ele olhou de novo e reconheceu a senhora.
Era sua tia Gina que estava ali e Lilo ficou ali observando o que ela fazia e ouviu o que ela dizia:
Lilo que saudades ! Que saudades !

Ela repetia entre suspiros.
Ele sentiu-se tonto e caiu perdendo os sentidos.
Quando acordou ele estava de volta ao seu sofá.
Pensou sobre tudo o que havia acontecido e não chegou a nenhuma conclusão.
Obviamente era uma sonho, mas algumas coisas foram tão reais ...
Lilo absorveu cada momento daquele passeio de Natal e refletiu muito e profundamente sobre tudo o que havia visto.
E por fim, rever sua tia Gina, foi demais para ele.
Ela era a última remanescente da geração de seus pais.
Ele morou por anos com ela quando seus pais morreram.
Um motorista embriagado causou o acidente fatal.
Os pais haviam saído para comprar os últimos presentes e doces que iriam distribuir no Natal, para crianças que eles visitavam todos os anos em um orfanato.
Faltava só uma semana para o Natal , Lilo tinha apenas 14 anos.
Ele nunca mais foi o mesmo .
Deixou de frequentar a Igreja, de ajudar nos trabalhos voluntários, enfim Lilo se tornou uma pessoa triste.
Ele culpou não só o motorista embriagado pela sua perda.
Para ele o "espírito natalino ' era o culpado de tudo.
A cada Natal ele dava uma desculpa diferente para não participar de nada junto com sua família e amigos.
Depois que foi para a faculdade, Lilo raramente visitava sua tia Gina.
E nos últimos três anos , ele sequer havia feito uma visita para ela.
Havia dado alguns poucos telefonemas para ela.
E quando ela tomava a iniciativa de ligar , ele muitas vezes tratava de desligar rapidamente ou nem mesmo chegava a atender.
Com o tempo ele parou de ligar e ela apenas aguardou .
Ele deixou a velha senhora de lado e pensou que ela havia feito o mesmo em relação a ele.
Entretanto ele viu naquele momento enquanto a observava pela janela, a doçura dos gestos dela, quando segurava sua foto e pode ouvir em sua voz o quanto ela realmente sentia sua falta.
Uma hora depois a campainha tocou.
Rapidamente a porta foi aberta.
Feliz Natal, tia Gina.
Feliz Natal Lilo !
A senhora o abraçou longamente .
E Lilo então, depois de tantos anos se sentiu novamente feliz!



quinta-feira, 17 de novembro de 2016

O Arlequim
O Começo do Mistério




Harry pediu a Fernando e Paula que fossem ao Baile Anual de Arrecadação de Fundos para Obras de Caridade, promovido pela Associação Charity Bless.
Eles iriam representar o Diário News, já que
 neste ano ele e Victória não estavam animados para comparecer.
"O Baile", como é conhecido o evento é sempre à Fantasia ou Traje de Gala. 

Paula ficou realmente animada com o pedido de Harry e Fernando fazia qualquer coisa para agradar Paula.
Fora isso não seria ruim para ambos sair um pouco da rotina.
"O Baile" era um daqueles eventos maravilhosos, que as pessoas mais ilustres da alta sociedade comparecem, para verem e serem vistas e ao final entregar um polpudo cheque. A arrecadação do Baile, sempre milionária é tradicionalmente revertida para pesquisas médicas e amparo a obras sociais relevantes.

O local estava ricamente decorado, a comida estava excelente e a bebida era das melhores.
A seleção de músicas estava perfeita, fazendo com que todos dançassem sem parar.
Assim, todos estavam se divertindo muito.
A festa estava realmente magnífica.

Paula adora dançar e Fernando não mede esforços para vê-la feliz .
Na verdade ele é que se sente muito feliz e envaidecido em tê-la em seus braços.
Nada para ele é melhor que poder passar horas com ela, ainda mais dançando e se divertindo para valer.
A noite já ia pela metade quando após mais uma rodada de músicas, ele a deixou para buscar bebidas.
Paula ficou ali, próxima ao bar, de pé, observando o ambiente.
Ela gosta muito de observar as pessoas e estava distraída olhando para a pista, por isso, não percebeu  quando um homem fantasiado de Arlequim se aproximou dela e sem dizer nada, a puxou com força para a pista de dança.

Rapidamente, antes que ela pudesse esboçar alguma reação, ele lhe disse que tinha algo para que ela entregasse a Fernando e deslizou de suas mãos para as dela um pendrive.
Paula, é muito esperta e tão acostumada a acontecimentos estranhos, que ficou tranquila e continuou dançando com o Arlequim, sem demonstrar qualquer reação que pudesse chamar a atenção dos demais.
Ela tentou falar com ele para obter alguma informação , mas o Arlequim levou um de seus dedos aos lábios dela, em um sinal característico de pedido de silêncio.
Então ele, delicadamente  a conduziu até o outro lado da pista, ou seja,  para o lado oposto ao lado em que a havia apanhado. 

Ele então sussurrou em seu ouvido que não o seguisse e com uma reverência, cortesmente beijou a mão dela e a deixou ali.
Após observar que ele, havia se dirigido em direção aos toaletes, pensou que certamente ele se livraria daquela fantasia e de lá sairia usando um traje qualquer que não permitiria que ela o identificasse
Seria inútil seguir o Arlequim. 

Então, por ser o mais sensato a fazer, Paula rapidamente voltou para o outro lado do salão a procura de Fernando.
Ele a esperava pacientemente em uma mesa que estava reservada para os diretores do Diário News.

Paula, rapidamente contou a Fernando o que havia acontecido e sem mais perda de tempo, deixaram  a festa e rumaram para a casa de Fernando para ver o conteúdo do pendrive.
Para surpresa deles o conteúdo era um arquivo chamado Dossiê Marietta.
Ao abrir se depararam com um relato  super detalhado, com fotos, nomes e informações sobre os dois homens e a mulher que estavam em Londres no dia do atentado contra a vida de Marietta.
A ficha deles dizia que tinham treinamento militar o que Fernando já desconfiava, pela postura deles naquele dia ao abordarem Marietta.
A surpresa ficou por conta da mulher que até então ele acreditava ter sido uma vítima como Bob e Marietta, e agora ficava claro, tinha sido uma distração para o desenvolvimento da ação.
O status dos três os marcava como desaparecidos em combate em 2008 no Iraque.

Só que não.
Fernando era testemunha de que eles estavam ativos e pelo jeito passaram a agir como mercenários.
Fernando e Paula, estavam atônitos com o acontecido. 

Todas estas informações, de onde haviam surgido?
Se não bastasse o surgimento inusitado das provas contra o Conselho, agora isso.

Eles se perguntavam como a Polícia não encontrou nada sobre nenhuma destas pessoas durante as investigações ?
Com estas informações novas vertentes de investigação surgiam.
São elementos novos e relevantes para a apuração dos fatos.
Haviam muitas dúvidas sobre quem planejou e qual a real motivação do atentado contra Marietta.

E quanto ao Arlequim ?
Quem estaria vestindo aquela fantasia?
Ou até mesmo quem o estaria ajudando nesta história?
Qual seu interesse?
Para quem ele estaria trabalhando?

A partir daí surgiam muitas outras dúvidas.
E todas pertinentes.

Quem montou o dossiê contido no pendrive?
Seria ele verdadeiro?

Como estas informações foram obtidas?
Fernando estava com a cabeça a mil e Paula conhecendo bem o amigo, sabia que ele precisava ficar só e pensar.
Depois quando ele tivesse tirado suas conclusões ele a procuraria para dividir suas idéias. Agora era hora de deixá-lo sozinho.
Então ela chamou um táxi e voltou para casa e para seus próprios pensamentos.

Afinal, ela esteve com o Arlequim.
Ela teve um contato físico com ele, ouviu a sua voz.
Ela sabia que precisava montar seu próprio quebra cabeças e tentar achar algo que permitisse identificá-lo.
Principalmente se houvesse um novo encontro entre eles, o que para ela não parecia impossível.
Assim, ela deveria estar preparada para isso.
E certamente estaria.
Enquanto isso Fernando, vi e revia o dossiê Marietta e quanto mais pensava, mais um fato ficava claro em sua mente e com isso tudo ficava mais nebuloso.

Quem planejou e quem executou o atentado, sabia exatamente o que queria fazer e onde queria chegar.
E isso certamente não incluía matar Marietta.
Homens como estes, não erram, não ferem.
Eles atiram para matar.






     

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

O Conselho
Um Poder Paralelo .


Enquanto escutavam as gravações que Fernando recebeu pelo correio naquela manhã de julho, Harry, Victória, Paula e o próprio Fernando se entreolhavam em um misto de excitação e dúvida.
A excitação vinha do inesperado conteúdo das gravações e a dúvida, sobre sua veracidade.
Depois de ouvir todas as fitas sozinho, Fernando chamou Paula para compartilhar com ela aquele material.
Era tão incrível que logo levaram para Harry e Victória. Harry se espantou, pois há muitos anos  não ouvia falar assim tão abertamente do Conselho.
O Conselho era uma temida sociedade secreta que por décadas vinha dominando todos os ramos de atividade no país.
O Conselho teve origem na década de 70 e fizera parte do então Governo como um órgão consultivo por assim dizer, mas seu grau de influência em todos os setores do Governo foi tamanho, que acabou banido.
Desde que retomou suas atividades, na clandestinidade, no começo dos anos 2000, ninguém conseguiu provar, não só sua existência como qualquer das atividades desenvolvidas. Ninguém se atreve a falar abertamente do Conselho, muito menos ousa dizer que foi ajudado por ele.
Cientistas, políticos, empresários, intelectuais e principalmente banqueiros fazem parte dos braços do Conselho.
Isso é sabido por todos.
Agora provar isso, até hoje ninguém provou.

Ao longo dos anos nenhum Governo nunca agiu concretamente para acabar com as atividades do Conselho. Os governantes sabem que para isso é necessário expor fragilidades e falhas que ninguém quer correr o risco de mostrar.
O Conselho por sua vez faz de tudo para não se expor.
O Conselho aprendeu com os revezes do passado que a clandestinidade e o sigilo são sua maior arma e assim, cada vez que se faz alguma investigação e se chega a provas de sua existência e atividades tudo é feito para que estas provas sejam desacreditadas, consideradas falsas ou simplesmente acabem desaparecendo, como se nunca houvessem existido . Com isso nenhuma investigação consegue ter prosseguimento. 

Por isso, ninguém naquela sala podia acreditar no que estava acontecendo.
Quem teria feito estas gravações, como conseguira fazê-lo? Teria que ser alguém muito próximo ao Conselho, pois eram escutas feitas em uma sessão do Conselho e se fossem reais comprovavam não só sua existência como dava uma dimensão de sua atuação.
Através delas poderia se saber quem eram seus membros, como agiam todos os seus braços, inclusive o braço armado que cuidava da segurança de seus membros e executavam algumas ações consideradas imprescindíveis para a manutenção da ordem e do próprio Conselho.

As gravações traziam muitas informações, mas ficavam algumas perguntas.
Quando teriam sido feitas estas escutas?
Quem as teria feito?
Qual seria seu objetivo?
Enfim, coisas que talvez nunca se soubesse ao certo.
No passado o Diário News já havia tentado, sem resultado por muitas vezes investigar as atividades do Conselho.
Agora com estas gravações se podia expor que o Conselho havia se infiltrado novamente em todos os níveis da sociedade organizada e das esferas governamentais.

Pelas gravações ficava claro que o Conselho tinha a seu favor além da capacidade intelectual de seus membros, recursos financeiros abundantes para financiar suas atividades. Claramente  eles tinham dinheiro, influência e acesso a todo tipo de informação. 
Enfim o Conselho possuía todos os elementos para a formação de um Poder Paralelo.

Eram apenas áudios, nenhum tipo de imagem, mas certamente bastavam para conseguir a mais sensacional matéria jornalística de todos os tempos.
Decidiram então que Fernando e Paula fariam sigilosamente a transcrição dos áudios e montariam a série de reportagens a serem publicadas. 
Com certeza estas publicações forçariam as autoridades a abrir muitas investigações oficiais. 

 Eram tantos dados que seria quase que impossível que as investigações não levassem a mais provas.
Com certeza todo um processo de mudanças políticas e administrativas teria inicio no País.
Isso seria inevitável.
Harry deixou claro que achava tudo isso sensacional e estava disposto a bancar os riscos que isso representava.
Com toda sua experiência Harry sabia bem que este tipo de matéria tinha um grau muito elevado de periculosidade tanto para o Jornal quanto para ele e sua equipe.

Para Fernando e Paula também era uma grande oportunidade.
Os dois sabiam também que não era um assunto qualquer a mexer, era como se diz, botar a mão no vespeiro.
E todos ali tinham uma grande noção do tamanho do vespeiro.
Fernando sabia, ao mostrar o material que recebera a Harry, que sua credibilidade como jornalista aliada à liberdade editorial que Harry tem, lhes permitiria bancar esta aposta, por mais alta que fosse.
Os louros que o Diário News colheria bem como eles do ponto de vista profissional, sob todo os aspectos , compensavam os problemas que certamente iriam enfrentar.

Ao final do dia, depois de muitas conversas e planejamento, foram todos para casa, com muitas expectativas para a longa jornada que se iniciaria. 
Na manhã seguinte, todos foram surpreendidos ao chegar ao Jornal.
Um vigia noturno e dois jornalistas que estavam de plantão foram encontrados, logo cedo, pelos primeiros funcionários a chegar, presos em um dos banheiros da redação.
A redação e a sala de Harry estavam totalmente reviradas.
As câmeras de segurança do prédio haviam sido desligadas.
A única coisa que se sabia é que dez homens armados e encapuzados chegaram durante a madrugada e sem usar de violência prenderam os reféns e reviraram tudo.
A polícia foi chamada e todos foram unanimes em seus depoimentos.
Após uma detalhada verificação ficou constatado que  nada fora levado, máquinas, computadores e demais eletrônicos, tudo estava lá.

A polícia concluiu que o Diário News fora vítima de um atentado.
Nenhum prejuízo material foi constatado, nenhuma ameaça ou agressão física fora praticada, ficou apenas uma grande bagunça.
Somente Harry, Victória, Paula e Fernando, sabiam o inestimável prejuízo que esta ação causara.
Prejuízo, para eles, para o Diário e para o País.
As gravações haviam sido levadas.
Não havia nada a fazer, nem a dizer, a quem quer que fosse nem mesmo a Polícia.
Harry resolveu confirmar para a Polícia que não haviam levado nada do Jornal.
Era melhor assim, mais seguro.

Não havia como denunciar o ocorrido.
Ninguém jamais acreditaria na existência das gravações e sem elas, mais uma vez nada seria provado contra o Conselho.
De nada adiantava escrever uma linha sobre o assunto.
Após a Polícia ir embora, Harry se trancou em sua sala com 
Victória, Paula e Fernando.
Todos tinham uma certeza, fora  
uma ação do Conselho que mostrou claramente seu poder.
Ao mesmo tempo ficava a dúvida para todos, como eles tinham descoberto que as gravações foram feitas e chegaram até a redação.
Somente eles sabiam das gravações e ninguém ali teria interesse em sumir com as mesmas , isso era certo.
Harry, Victória e Paula, estavam visivelmente abatidos.
Fernando foi o único a não demonstrar abatimento, apenas sua irritação foi notada quando se deparou com o cenário na Redação.

Ele não havia dito nada a ninguém, e diante dos fatos achou melhor se calar.
Experiente após conhecer o conteúdo das gravações, antes de mostrar aos demais ele fizera várias cópia de todo o conteúdo recebido e além de levar o material físico para vários lugares seguros, subiu todo o conteúdo para um site de armazenamento em nuvem.  
No momento certo, quando se sentisse seguro, ele começaria a investigar e produziria a matéria sobre o Conselho.
Até lá ninguém, por segurança, nem mesmo Paula saberia disso.
Era melhor assim.





quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Lembranças
Mal Súbito ou Abdução ?



Depois de uma semana intensa de trabalho, Fernando sentia-se péssimo.
Ele estava cansado, quase sem dormir e principalmente com fome.
Na verdade nem se lembrava mais quando fora sua última refeição completa.
Tinha estado a base de café e sanduíches nos últimos dois dias, e agora só queria chegar em casa, comer e dormir.
Sim, dormir seria muito bom.

Quando fora mesmo a última vez que dormira mais que quatro horas seguidas, ele pensou,  mas isso outra vez ficaria para mais tarde.
Ele prometera para Paula e seus amigos que iria à festa na casa de Harry.
Sim, ele tinha que ir, todos o estavam esperando.
Por conta do extremo cansaço Fernando dirigia devagar, por isso nada aconteceu de pior quando o carro simplesmente parou. 

Fernando então procurou sua lanterna no porta luvas, desceu, abriu o capô e revisando tudo, não achou nada errado.
Foi quando viu a luz.
Era uma luz muito forte, vinda do alto, um helicóptero ele pensou.
Ele olhou para o alto e então sentiu uma tontura e caiu. Acordou na maca.
O que houve ele pensou ?
Em um impulso natural tentou levantar.
Não pode.
Algo o prendia.
Sentindo-se fraco adormeceu novamente.
Acordou com luzes que percorriam seu corpo e sentiu uma dor no pulso.
Não conseguia discernir bem, mas ouvia sons.
Ele perdeu a noção do tempo.
Há quanto tempo estaria ali?
Por que não falavam com ele?
Ele podia distinguir vários vultos ao seu redor, mas sua vista estava estranha, como que nublada o que não lhe permitia ver com clareza ou distinguir as imagens.

Dormiu e acordou por tantas vezes que já não conseguia mais saber quantas vezes fora.
Enfim, acordou novamente e percebeu que estava deitado na estrada em frente ao carro.
Agora sentia-se bem.
O cansaço e a fome haviam passado.
Sem entender bem o que havia acontecido com ele, fechou o capô do carro, entrou e tentou dar partida no motor o que para seu total espanto conseguiu imediatamente.

Era incrível, o carro funcionava como se nada houvesse acontecido de errado.
Pensativo dirigiu até o local da festa.
Não esperava encontrar mais ninguém, mas o que mais podia fazer, naquele momento.
Ele havia perdido a noção do tempo, o relógio do carro, estava com problemas fazia vários dias e ele sem tempo não havia arrumado e para piorar esquecera seu relógio de pulso em casa.
Pegou seu celular para ligar para Paula, mas estava sem bateria, assim nem as horas podia ver.
Dirigiu por no máximo vinte minutos e quando chegou, para seu espanto todos estavam lá.
Desconfiado ele perguntou para Paula se estava atrasado.
Ela sorrindo, meio sem entender o motivo da pergunta, respondeu que não.
Não sabendo bem o que dizer para Paula e também para que ela e os demais não se preocupassem com ele, nada falou sobre o ocorrido.
Tratou de aproveitar a festa.
A noite foi perfeita, boa conversa, boa comida e Paula estava linda, como sempre.
Ela estava muito alegre e ele adorava quando podia desfrutar assim, de sua companhia.
Era incrível, mas,  todo aquele cansaço havia sumido como em um passe de mágica.
Quando ele chegou em casa, começou a rever mentalmente tudo o que havia acontecido.
A lógica e os fatos o levaram a concluir que teve um mal súbito.
O desmaio certamente fora causado por  hipoglicemia e  o cansaço extremo depois o levou a um sono profundo.
As visões que tivera não passaram  de um sonho.
Só uma coisa ainda o intrigava muito.
Uma fina marca escura em seu pulso esquerdo em um formato retangular.
Ela não estava lá antes...








quinta-feira, 6 de outubro de 2016

A Fonte
Como Explicar ?


Fernando estava sozinho na redação.
Cada um que estava no plantão tinha saído para fazer algo. 
Eram poucos por plantão, um saiu para comer , outro havia saído para acompanhar uma ocorrência importante e Fernando ficou lá preparando uma matéria para o dia seguinte. 
Então tudo estava no mais absoluto silêncio quando o homem chegou.
Ele parou em frente à mesa de Fernando e foi logo falando sem se deixar interromper.
Fernando abismado com o que estava ouvindo, prestou muita atenção a tudo, fazendo pequenas notas em um papel que estava em sua frente.
Quando o homem por fim parou de falar, como Fernando tinha muitas perguntas a fazer, virou-se para pegar o gravador, seria mais fácil assim.
Foi uma questão de segundos, mas quando se voltou o homem desaparecera.
Fernando então se levantou e foi atrás dele.
Saiu da redação, andou pela recepção e seguiu pelo corredor até os elevadores.
Como não o encontrou, seguiu até a porta que dá acesso às escadas e olhando para baixo, não viu ninguém ou sequer ouviu algum barulho na escada.
Era incrível, mas o homem havia desaparecido sem deixar qualquer vestígio. 
Nos três dias seguintes Fernando procurou informações sem sucesso.
Mesmo assim, diante da gravidade dos fatos e da riqueza de detalhes fornecidos por aquele homem misterioso foi a Polícia.
A história toda era realmente incrível e cruel, mas em vista da credibilidade de Fernando como jornalista do Diário News, o delegado responsável começou uma imediata investigação.
Diligências foram feitas para apurar a história e localizar o homem que fora ao Jornal.
Como as informações eram de uma precisão absoluta, rapidamente encontraram uma sofisticada clínica onde havia além de laboratórios de pesquisas, salas para procedimentos cirúrgicos , quartos para pacientes e muito material cirúrgico, químico e remédios.
Tudo isso era utilizado para a realização de experiências genéticas legalmente proibidas.
Prisões foram feitas e pessoas que estavam em cativeiro foram resgatadas.
Fernando pode acompanhar o dia em que a clínica foi invadida e teve acesso a arquivos com informações e fotos de pacientes-cobaias usados nos terríveis experimentos.
Entre eles reconheceu o homem que falara com ele.
Sem dúvida era ele.
Para sua surpresa o arquivo informava seu falecimento no ano anterior durante um procedimento.
Ele ficou sem ação, não sabia o que fazer, resolveu não revelar sua intrigante descoberta à Polícia.
Se falasse que aquele homem, era sua fonte quem iria acreditar?
Claro que tudo poderia ser um engano de sua parte.
Sua memória poderia o estar traindo e ele poderia estar equivocado no reconhecimento daquele rosto.
Entretanto, Fernando em seu íntimo tinha certeza de que aquele rosto era do homem que estivera no Jornal.
O que havia acontecido ele não poderia explicar, nem tinha como provar, seria para sempre um mistério.
Então ele rapidamente tomou sua decisão.
A experiência dizia que era melhor assim, que era melhor permanecer calado e deixar a Polícia fazer sua investigação.
Quanto àquele homem e sua ida ao Jornal, Fernando decidiu que este seria mais um segredo de redação.







quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Instinto
Sempre um Poderoso Aliado !









Fernando passeava por Londres, aproveitando os últimos dias de suas férias. 
O dia estava muito agradável e ele queria aproveitar para fazer algumas fotos. 
Ele observava todos os detalhes das ruas por onde passava.
Ele estava sempre em busca de um momento especial. Daqueles momentos únicos que valeriam uma boa foto. Foi quando avistou Marietta e Bob.
Seu instinto dizia que deveria segui-los. 
Marietta acabara de ser indicado para concorrer a Presidência da República.
Não era normal que estivesse tão longe de casa e andando pelas ruas quase que disfarçado.
Mais anormal ainda era o fato de que nenhum veículo de comunicação tivesse divulgado algo sobre sua chegada a Londres. 
Fernando começou então a fotografar os dois. 
Mesmo parecendo que eles estavam relaxados e alegres, ele ainda sentia que havia algo de errado naquela cena.
Ele iria segui-los para saber o que era. 
De repente, uma jovem muito bonita se aproximou deles com um mapa na mão como que pedindo informações. 
Ela mantinha o olhar fixo em Marietta e o dedo no mapa, como que mostrando um lugar. 
Ele pegou o mapa e passou para Bob. 
Os três começaram a conversar animadamente, assim distraídos , não viram quando os dois homens chegaram. 
Fernando registrava tudo.
Os homens eram absolutamente comuns vestiam calças jeans e jaquetas de couro. 
Entretanto por um descuido um deles deixou entrever por dentro da jaqueta uma pistola.
Fernando pensou em se aproximar, tirar a atenção do homem que ia em direção a Marietta, mas teve receio de provocar uma reação naquele homem. Fernando não tinha ainda certeza do que se tratava.
Poderia não ser nada, mas poderia ser por exemplo um assalto e um gesto  abrupto e o homem poderia sacar a arma e tudo poderia terminar em tragédia. 
Então Fernando resolveu continuar fotografando. 
O homem da pistola pegou a pasta de Marietta. 
A moça então correu se confundindo com a multidão. Fernando fotografava.
Os dois homens começaram a se afastar. 
Marietta e Bob se olharam e antes que pudessem dizer qualquer coisa o impensável aconteceu. 
Marietta caiu ao chão alvejado por dois tiros e Bob foi alvejado de raspão. 
Os dois homens, levando a pasta de Marietta, então entraram em uma rua e Fernando não os viu mais.
Fernando pensou em segui-los, mas resolveu que seria melhor e mais seguro ajudar Marietta e Bob.
Começou então uma correria generalizada.
As pessoas na rua corriam, gritavam e choravam pensando se tratar de um atentado terrorista. 
Fora Fernando, até aquele momento, ninguém havia reconhecido Marietta.
Fernando chamou socorro e a Polícia e tratou de ficar 
próximo a eles para poder acompanhar o desenrolar dos fatos.
Quando a Policia chegou  ele tratou de se afastar para não ser obrigado a ir a uma delegacia para prestar esclarecimentos. 
Quando as ambulâncias chegaram,  Fernando, rapidamente perguntou aos motoristas para onde eles seriam levados.
Assim Fernando pode rumar com eles para o hospital. 
Passado o susto inicial Fernando começou a rememorar os acontecimentos.
Tudo soava muito estranho para ele. 
Novamente seu instinto lhe dizia: não fora um assalto. Fernando ficou chocado ao saber da versão dos fatos que Bob apresentou às autoridades.
Ele afirmou que tudo não passou de um assalto. 
Até ai , embora Fernando estivesse desconfiado da motivação daqueles homens, ele não tinha como desmentir essa versão. O que ele não se conformou foi por Bob declarar a Policia que o assalto ocorreu em um local diferente do que realmente aconteceu.
Ele disse que os homens deram voz de assalto, o que Fernando sabe que não ocorreu, ambos apenas mostraram as armas e um deles pegou a pasta das mãos de Marietta.
Bob disse ainda que os homens atiraram quando perceberam estarem sendo seguidos por Marietta e Bob.
Por que Bob, inventou essa versão dos fatos.
Eles não fizeram qualquer gesto, nem se mexeram do ugar para tentar recuperar a pasta de Marietta. 
O que estaria por traz da atitude deliberada de Bob de alterar os fatos?
O caso então com base no depoimento de Bob,  foi então registrado como tentativa de latrocínio. 
Com o passar dos dias os médicos afirmaram que apesar da gravidade dos ferimentos Marietta iria sobreviver. 
A Polícia apesar de todos os seus esforços, não logrou êxito em encontrar os dois homens e a mulher.
Para a Polícia os três agiram juntos cabendo a mulher ser um chamariz para distrair Bob e Marietta. 
Eles tampouco conseguiram identificá-los através das fotos tiradas por Fernando.
Ele depois de enviar todo seu material para o jornal forneceu cópias para a Polícia. 
Não havia nenhum registro policial sobre eles e até mesmo a Interpol foi acionada sem sucesso. 
A matéria de Fernando acabou lhe rendendo um prêmio. 
Entretanto, não se sabe por que mesmo após as fotos serem publicadas e a matéria falar abertamente que a versão dos fatos contada por Bob, não era precisa, foi a versão de Bob que se oficializou e nada em sentido contrário foi levado em consideração. 
Fernando em vista dos fatos, encerrou imediatamente suas férias e de volta à redação, começou a investigar o caso.
Ele e  o editor do Jornal Harry Nebor, tinham certeza que algo não se encaixava nesta história toda. 
Muitas eram as perguntas sem resposta. 
O que Bob e Marietta faziam em Londres naquele momento que era tão importante para a carreira de Marietta estar no seu próprio país? 
Quem eram as pessoas que os atacaram? 
Por que Bob propositadamente alterou sua versão dos fatos para as autoridades? 
Por que apesar das fotos mostrarem o contrário a Polícia acatou a versão de Bob para o caso? 
E ainda e mais importante: se não foi um assalto, quem queria matar o candidato? 
Bom, tudo isso é outra história. 
E Fernando tinha certeza que um dia iria descobrir.




quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Padma
O que de fato aconteceu ?




A noite estava maravilhosa. 
Estava quente, mas agradável  e o céu incrivelmente estrelado.
A vista era magnífica. 
Do alto do décimo oitavo andar era possível divisar a maior parte da cidade, o que significava um show de luzes , que deixava qualquer um sem fôlego  e garantia que todos  por mais que estivessem acostumados ficassem ao menos por alguns minutos parados ali olhando para tanta beleza.
A localização do prédio na região mais alta da cidade fazia daquele terraço um ponto de observação mais que perfeito.
Já passava das onze horas e Marie não queria, não sentia a mínima vontade de dormir e ficou ali no terraço olhando para as luzes da cidade.

Era um momento tão perfeito que ela não notou o tempo passar e viajou em seus pensamentos e lembranças.
De repente  sua atenção foi chamada por um som.

Ao longe ela ouvia um barulho que a princípio não conseguia definir, ele vinha de  longe e se aproximava lentamente como que trazido pelo vento. 
Marie não deu muita atenção ao som indefinido e continuou ali, admirando a cidade.
Entretanto o som foi se tornando mais nítido e pode ser identificado.

Marie não podia acreditar no que estava ouvindo.
Eram aviões, certamente eram aviões, mas não se tratavam de aviões modernos.
O barulho que ela ouvia era de hélices, muitas hélices, girando, girando, até que quando ela deu por si começou a ver aquelas luzes e ouvir um som inconfundível.

Por mais absurdo que isso fosse, era indiscutível, eram aviões de combate e estavam atacando a cidade.
Ela os via claramente, via os aviões dispararem seus canhões e bombas e via o clarão dos alvos sendo atingidos e o som que isso gerava.
Então do solo baterias antiaéreas tentavam sem sucesso atingir o inimigo e repelir aquele ataque.

Era como se ela estivesse diante de uma grande tela, assistindo a um filme antigo de Guerra.
Ela não podia acreditar no que seus olhos viam e seus ouvidos estavam ouvindo.
Era tudo um absurdo, não podia estar acontecendo.
Não fazia qualquer sentido.
Era assustador e aterrorizante.

O barulho era cada vez maior e as luzes que subiam e desciam iluminavam cada vez mais a noite.
Então, uma bomba atingiu um prédio próximo e Marie se deu conta que precisava sair de onde estava e fugir.
Ela então andou pelo longo terraço.
Todos os quartos tinham uma janela para o terraço, e ela olhava para dentro procurando por sua mãe e seu marido. 

Marie parou na janela do quarto da mãe e a encontrou calmamente sentada na cama em posição de contemplação. Marie lhe disse que se apressasse, pois precisavam sair dali com a máxima urgência. 
A mãe entretanto, com toda calma lhe respondeu que não iria a lugar algum, pois não havia para onde ir.
Seu tempo era chegado, e  ficaria ali mesmo.
Disse ainda que Marie deveria se apressar e seguir seu marido.
Neste momento uma nova bomba caiu mais próximo ainda e Marie percebeu que não adiantaria insistir.

Com lágrimas nos olhos ela apenas disse, adeus e um eu te amo para sua mãe e voltou para dentro do apartamento  procurando  pelo marido.
Ela o chamava pelo nome, abria portas e não o encontrava. Era uma situação angustiante.
Fora o combate parecia não ter fim.
Finalmente ela se deu conta que uma luz estava acesa.
Era a luz do escritório, que ficava na outra ala do apartamento.
Com certeza ele estaria lá.
Quando ela abriu a porta levou um susto tremendo. 
Um grupo de pessoas estava lá dentro, eles estavam de mãos dadas  formando um círculo. 
Eles faziam uma oração em voz baixa.
Marie não tinha a menor ideia de quem eram aquelas pessoas ou como tinham chegado lá.
Ela não os conhecia e não conseguia entender o que estava acontecendo.

Eles se calaram ao perceberem sua chegada.
Foi então que uma voz disse ao grupo que estava tudo bem, que ela poderia ficar pois estava preparada para isso.
Ela não entendeu nada.
Preparada para o que, ela se perguntou.

Ao mesmo tempo, se deu conta, de que quem havia falado era seu marido.
Não o havia reconhecido de imediato, pois ele estava usando um tipo de máscara para facilitar a respiração.
O que seria aquilo?
Bom, como até aquele momento, nada fazia sentido, este fato era só mais uma das muitas coisa sem nexo, naquela situação.

Àquela altura, ela também não estranhou, quando o círculo se abriu e mãos se estenderam em sua direção num gesto claro de que ela deveria se juntar a eles.  
Ela hesitou  por alguns segundos  e ao perceber sua dúvida o marido a encorajou a se juntar a eles.  

Ele afirmou que tudo ficaria bem, que eles seriam retirados dali  e que não havia o que temer.
Ela então, sem pensar em mais nada,  começou a estender a mão direita que foi logo tomada por uma mulher  muito forte que a segurou  firmemente. 
Quando ia estender a mão  esquerda  para fechar o círculo novamente a porta se abriu chamando sua  atenção.
Era uma criança de uns oito anos no máximo. 
Uma menina com aparência terrivelmente assustada,  com  lagrimas nos olhos e respiração ofegante. 

Marie então a reconheceu.
Era  Padma, a filha de um casal indiano que vivia no apartamento ao lado. 

Marie então, de imediato, sem pensar, soltou a mão da mulher e foi na direção de  Padma  para abraça-la e traze-la para o círculo.
Marie sabia que não poderia deixa-la ali sozinha olhando para eles, muito menos mandá-la embora.
Ela não faria isso.

Quando ela soltou a mão que a segurava, seu marido gritou. Foram apenas duas palavras um Não e um  Volte .
Segurando a mão de Padma, Marie olhou para eles e começou a voltar em direção ao grupo.
Então o mais inacreditável aconteceu.
O circulo se fechou, e diante dos olhos dela, 
 todos desapareceram. 
Ela somente conseguiu ouvir seu  marido dizer que voltaria para buscá-la. 
Na sala, se podia ver  uma suave nuvem de fumaça branca no lugar aonde estivera formado o círculo de pessoas.
Marie ficou ali sozinha com Padma.
Lá fora o barulho das bombas ficava mais e mais intenso.
As lágrimas rolavam no rosto de Marie.
Ela não sabia o que fazer, apenas sabia em seu íntimo que fizera a coisa certa.
Proteger Padma.

Em pouco tempo o barulho das bombas cessou e não se ouvia mais os aviões.
Marie então, segurando Padma pela mão foi até o terraço.
Tudo estava quieto e escuro.
Uma escuridão total e aterrorizante.
O show de luzes não se via mais.

Ela então, sem saber o que fazer foi para o seu quarto  e se deitou com Padma.
Quando amanhecesse elas sairiam para tentar saber o que havia de fato acontecido.
O cansaço venceu a ambas e elas dormiram.
Ao acordar Marie não encontrou Padma.
Andou um pouco pela sala, e pelo não havia mais ninguém em casa.

Foi até a sacada e viu que tudo estava bem.
Tudo estava normal, não se via qualquer estrago ou sequer vestígio daquela noite pavorosa.

Ligou a TV e nenhuma notícia, acessou a Internet e nada.
Ela então finalmente se deu conta de que aquilo não acontecera.
Sim, ela tivera um sonho.
Um terrível pesadelo.

Ela respirou aliviada e sorriu.
Fora tremendamente real e assustador, mas apenas um pesadelo.

Então foi até a cozinha fazer o café,  agora estava com fome .
Então pensou em  sua mãe e no marido.
Aonde eles teriam ido tão cedo?

Marie colocou água para o café e foi até o quarto da mãe, para ver se encontrava alguma pista sobre o paradeiro dela.
Quando abriu a porta, para sua surpresa a encontrou  na cama.

Ela se aproximou e pode perceber que a mãe tinha uma expressão plácida, mas, estava sem vida. 
Seu coração disparou e ela correu para a sala para chamar por ajuda.
Enquanto andava pensou no marido, se ele ao menos estivesse em casa.

Por que ele saiu sem se despedir? 
Antes que ela conseguisse chegar ao telefone o  aparelho tocou.
Era do escritório do marido.
Sam, como eles o chamavam,  não havia aparecido para trabalhar e como ele nunca deixava de avisar caso tivesse algum problema estavam preocupados.

Marie não conseguiu conversar com a pessoa do outro lado da linha.
Ela apenas chorava, sem saber o que fazer ou dizer.
Nada mudou nos dias que se seguiram.

Marie enterrou sua mãe e passou a procurar pelo marido sem sucesso.
Então, depois de alguns dias de aflição intensa, ela se lembrou de Padma  e foi até o apartamento dela.
Como não havia ninguém perguntou  pela  família aos vizinhos e foi aí que soube que os pais de Padma tinham sofrido um grave acidente, na mesma noite da morte de sua mãe e estavam ambos em estado grave no hospital e que Padma fora levada para a casa de parentes na manhã seguinte.

Os meses se passaram sem novidades.
Marie sem ter outra alternativa se conformou e passou a esperar.

Sim, esperar, pois tenha sido um sonho, pesadelo, premonição, seja lá o que fosse , coisas aconteceram  naquela noite.
Coisas aconteceram tanto com sua mãe, como com Sam e com os pais de Padma.
Seja lá o que aconteceu de verdade naquela fatídica noite, Sam prometera voltar para buscá-la.

E ele nunca falhou com ela.