quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Lilo odiava o Natal.





Sim,  Lilo odiava profundamente o Natal.
Para ele era apenas uma época horrível em que se gastava muito dinheiro, se comia e bebia demais e as pessoas  só queriam exibir os presentes caros que davam e recebiam.
Então dia 24 de dezembro, ele comprou uma pizza, escolheu filmes, desligou o celular e deitou no sofá bebendo uma cerveja gelada.
A única concessão que ele fazia era acender uma luminária que sua última namorada lhe deu de presente .
Ele detestou o presente de começo, entretanto passou a deixa-la acesa, não como decoração de Natal, mas por que podia deixar as demais luzes da casa apagada.
Para Lilo, isso  desencorajava qualquer vizinho a bater em sua porta na noite de Natal. 

De repente a campainha tocou e ele espantado e praguejando foi abrir a porta.
Quem poderia ser aquela hora.
Todos os seus amigos já haviam desistido de  tentar levá-lo a qualquer celebração natalina.
Ninguém  mais , sequer ousava , dar um simples telefonema no Natal, quanto mais aparecer em sua casa.
Daí o espanto com aquela inesperada presença em sua casa .
Ao abrir a porta, Lilo se deparou com  um garoto de no máximo 14 anos que olhou para ele e logo foi dizendo:

Nossa !
Você está horrível cara!
Ele respondeu em um tom nada amistoso:
E quem é você?
Eu sou você há vinte anos atrás !
Vim para te mostrar umas coisinhas...
Lilo então ao ouvir o que julgou ser um enorme disparate, tratou de bater a porta na cara do maluco.
Sim, só podia ser um maluco, mas o garoto travou a porta com o pé e disse:
Não !
Você vem comigo e vem agora !

Só trata de pegar um casaco.
Enquanto calçava os sapatos, Lilo começou a pensar que era um  trote de algum de seus amigos, mesmo sem imaginar quem teria a infeliz ideia de fazer isso com ele, mas resolveu ir para ver onde isso ia dar.
Claro, que ele já começou a pensar na vingança que realizaria contra este ousado.

Ele saiu sem pegar um casaco, afinal a noite estava quente.
Quem precisaria de casaco?
O garoto o pegou pela mão e sem dizer uma palavra saiu pela porta de incêndio do prédio.
Quando Lilo deu por si, após atravessar a porta, estava na rua, em um lugar que ele não tinha a menor ideia de qual era, mas estava frio,  muito frio e pequenos flocos de neve começavam a cair.
Ele reclamou e o garoto riu e disse: não mandei trazer um casaco!
Lilo olhava para tudo atônito sem entender absolutamente nada do que estava acontecendo.
Andaram um pouco e chegaram a um hospital onde muitas pessoas cantavam lindas canções natalinas para os enfermos.
Todos estavam felizes, apesar dos problemas inerentes ao fato de estarem em um hospital.
Lilo e o garoto escutaram algumas canções.
O garoto chegou mesmo a acompanhar algumas delas.
De repente o garoto puxou Lilo pelo braço e fez sinal que o seguisse e se dirigiram a porta de saída.
Ao passar por ela, Lilo percebeu que estava em outra cidade totalmente diferente e caminharam por algumas ruas iluminadas por luzes de diversas cores, até uma Igreja onde pessoas reverentes assistiam ao Serviço Religioso.
Ficaram lá por tempo suficiente para que Lilo percebesse a paz e alegria que pairava no ar.
As pessoas ouviam o sermão , entoavam alguns cânticos e sorriam.
O garoto fez questão de esperar o fim do Serviço Religioso, cumprimentou algumas pessoas e  Lilo foi obrigado a fazer o mesmo.
Era estranho, mas ele tinha a impressão de já ter estado naquele lugar, um verdadeiro "déjà vu"
Ao sair da Igreja se deu conta que não mais sentia frio, ao contrário estava quente.
Ele então percebeu que estava em outro local.
Era um local muito simples, quase sem iluminação.
Andaram por alguns minutos, o garoto não dizia nem uma palavra.
Aliás, desde que, saíram de seu apartamento o garoto falou pouco e depois do hospital, não disse mais uma palavra sequer.
Ele se recusou a continuar falando, fazendo apenas pequenos gestos com as mãos e com a cabeça.
Eles caminharam até uma rua sem saída, mas cheia de casas,  onde algumas pessoas cantavam e dançavam na rua.
A música era feita por um grupo de homens que tocavam alguns poucos instrumentos, enquanto assavam alguns espetinhos de carne e linguiças em uma churrasqueira improvisada.
Crianças corriam por todo lado.
E todos estavam felizes.
Todos, dava para se notar, estavam se divertindo.
O garoto entrou em uma casa e Lilo o seguiu.
Naquele momento Lilo levou o maior susto, por que quando entraram na casa, ao invés de móveis e paredes, eles chegaram a uma praça.
Neste local muitas pessoas faziam fila para receber uma refeição e um pequeno bolo de Natal.
E ele viu que todos os que estavam ali, inclusive os que estavam trabalhando estavam felizes.
Uns estavam felizes por receber aquela refeição e os outros por poderem proporcionar aquele momento.
Continuaram andando e pararam diante de uma janela de uma linda casa, onde uma velha senhora arrumava tudo para a ceia de Natal e parava para olhar para um porta retrato.
Foi estranho, mas era como se ele estivesse observando de dentro da casa.
Ele podia ver tudo lá dentro e ouvir o que ela dizia.
Lilo estremeceu ao perceber que a foto era dele.
Ele olhou de novo e reconheceu a senhora.
Era sua tia Gina que estava ali e Lilo ficou ali observando o que ela fazia e ouviu o que ela dizia:
Lilo que saudades ! Que saudades !

Ela repetia entre suspiros.
Ele sentiu-se tonto e caiu perdendo os sentidos.
Quando acordou ele estava de volta ao seu sofá.
Pensou sobre tudo o que havia acontecido e não chegou a nenhuma conclusão.
Obviamente era uma sonho, mas algumas coisas foram tão reais ...
Lilo absorveu cada momento daquele passeio de Natal e refletiu muito e profundamente sobre tudo o que havia visto.
E por fim, rever sua tia Gina, foi demais para ele.
Ela era a última remanescente da geração de seus pais.
Ele morou por anos com ela quando seus pais morreram.
Um motorista embriagado causou o acidente fatal.
Os pais haviam saído para comprar os últimos presentes e doces que iriam distribuir no Natal, para crianças que eles visitavam todos os anos em um orfanato.
Faltava só uma semana para o Natal , Lilo tinha apenas 14 anos.
Ele nunca mais foi o mesmo .
Deixou de frequentar a Igreja, de ajudar nos trabalhos voluntários, enfim Lilo se tornou uma pessoa triste.
Ele culpou não só o motorista embriagado pela sua perda.
Para ele o "espírito natalino ' era o culpado de tudo.
A cada Natal ele dava uma desculpa diferente para não participar de nada junto com sua família e amigos.
Depois que foi para a faculdade, Lilo raramente visitava sua tia Gina.
E nos últimos três anos , ele sequer havia feito uma visita para ela.
Havia dado alguns poucos telefonemas para ela.
E quando ela tomava a iniciativa de ligar , ele muitas vezes tratava de desligar rapidamente ou nem mesmo chegava a atender.
Com o tempo ele parou de ligar e ela apenas aguardou .
Ele deixou a velha senhora de lado e pensou que ela havia feito o mesmo em relação a ele.
Entretanto ele viu naquele momento enquanto a observava pela janela, a doçura dos gestos dela, quando segurava sua foto e pode ouvir em sua voz o quanto ela realmente sentia sua falta.
Uma hora depois a campainha tocou.
Rapidamente a porta foi aberta.
Feliz Natal, tia Gina.
Feliz Natal Lilo !
A senhora o abraçou longamente .
E Lilo então, depois de tantos anos se sentiu novamente feliz!



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